3 de agosto de 2012

Teologia dos Pés

Eu não tenho uma experiência espiritual tão forte como teve o Apóstolo João, segundo relatado em seu livro A Revelação - Apocalipse. Dentre todas as experiências narradas por ele, considero mais forte aquela onde ele vê o Senhor Jesus e cai aos seu pés, tamanha a Glória de presença divina. Essa passagem me faz chorar e adorar a Jesus ansiando por um momento como esse.

Porém, com minha não tão avançada idade, reconheço que tenho Jesus cada vez mais visível ao longo da minha vida. Sempre que sinto seu amor em me perdoar quanto cometo erros e pecados; quando sinto sua graça em me renovar na constante frieza que me segue neste árduo caminho. Mas o que me faz conhecer mais o Senhor Jesus é quando luto contra mim mesmo, quando venço minhas concupiscências e renego meu ego narcisista. É ai que vejo Jesus mais claramente perto e entranhando-se ao meu ser.

Há um tempo atrás, eu me veria brigando, defendendo-me, lutando pela verdade, argumentando conforme os escritos. Sim, eu não daria bandeira branca, nem descansaria meu pé enquanto não visse meus "inimigos" derrotados. Mas hoje, sei que meus inimigos não são as pessoas que caluniam, que mentem, que aumentam, que deturpam, que denigrem, que compentem, que invejam, que esperam a queda, que anseiam por más notícias. Por conhecer mais Jesus, sei que meu inimigo sou eu mesmo, minhas vontades, minha soberba, minha incompreensão, meu ser carnal. Logo, sabendo disso, não vejo porque guerrear contra gente que se nomeia meu adversário. So guerreio contra um, e este ja está vencido (falo do cão).

Por isso, por querer ver mais Jesus, opto pela prática da paciência, do perdão, do abrir-mão, do doar. Porque eu tenho visto O Cristo. Não como João O viu. Mas pelo menos eu tenho a liberdade de ver seus pés e ali adorá-lO, derramando minha vida, minhas inquietações, as injustiças e minhas próprias dores. Quem já viu os pés de Jesus não se ocupa de brigar por coisas, por assuntos inúteis, por teologias baratas, por defesas de si-mesmo. Quem já viu os pés de Jesus só quer ficar ali, quietinho, adorando e, mesmo que mal interpretado por alguns que dizem que eu não deveria estar ali, ignoro os comentários tolos de quem nunca soube o quanto faz bem estar diante do Nazareno. 

Enquanto alguns ocupam-se de proteger suas verdades, de lutar por suas moedas de prata, de garantir seu luxuoso modo de vida inútil e esbanjador, de manter seus ensinos vazios disfarçados de poder de Deus, de usar palavras e chavões que "legitimam" suas mensagens sem evangelho... Eu, prefiro ficar aos pés de Jesus, porque ali é o lugar para os despreparados espiritualmente, para os que não sabem lidar com toda pompa religiosa, para os que são pecadores e assumidamente declaram-se. Pois conhecendo os pés de Jesus, estou bem perto de conhecer o seu rosto e, como João, cair aos seus pés.
E isso, me basta.

24 de fevereiro de 2012

A Sinceridade de João e as crianças.


- Vamos continuar a aula de ontem.

- Vovô, vovô, fala sobre Jesus.

- Jesus é a razão de estarmos aqui.

- O Senhor andava muito Ele?

- Todos os dias.

- E Ele andava muito?

- Risos! - E como andava! Onde tinha gente, ele estava lá. Gostava de estar no meio de todos.

- E curava todos os doentes?

- Todos, não havia um sequer que Ele não pudesse curar.

- Até os coxos?

- Até os leprosos!

- Que isso? Ele falava com os leprosos?

- Ele abraçava os leprosos, os samaritanos, os piores pecadores.

- Jesus era bom, né vô João?

- Nem sempre! Na visão de alguns Ele era muito ruim.

- Ele maltratava as pessoas?

- Ele combatia a falsidade, a mentira, a hipocrisia...

- O que é hipocrisia vovô?

- E fingir ser bom. É mascarar a realidade. É tudo que Ele menos gosta.

- Vovô, vovô, Jesus morreu na prisão?

- Não, foi na cruz – outra criança.

- Isso, Ele se entregou na cruz voluntariamente.

- Ele voltou a viver?

- Sim. Está vivo agora, pertinho de nós.

- Só que agora Ele é invisível né?

- Sim, a gente ainda não O vê, mas o veremos como Ele é.

- O que o senhor mais gostava em Jesus vovô?

- Ah, Jesus! Meu Senhor, meu amigo, meu mestre. Eu gostava de aprender. Não havia um momento se quer que Ele não estivesse ensinando.

- Ele era professor também?

- Sim, e que professor! Até em silêncio Ele nos ensinava algo.

- E Jesus gostava de crianças?

- Crianças? Ele amava estar com crianças como vocês. Ele disse que pra entrar no céu

todos nós adultos deveríamos ser como crianças...

- Eu quero ser criança pra sempre Vovô!

- Eu também!

- Eu também!

- Vovô, o senhor viu Ele morrer?

- Vi. Eu estava de frente pra Ele. Ele estava pendurado no madeiro, sem forças até pra falar... Mas a melhor imagem que tenho dEle foi vendo-O glorificado, exaltado nos céus e com poder e glória. Quando eu O vi caí aos seus pés, fiquei sem forças.

- Jesus gostava do senhor vovô?

- Jesus tinha tanto amor pra dar que todos se sentiam amados por Ele. Eu sempre estive bem perto, queria aprender o máximo que podia com Ele. Tinha momentos que eu não resistia e O adorava diante de todos. Quando eu estava muito triste, recostava minha cabeça em seu peito e descansava ao lado do meu Mestre...

- Vovô, o senhor tá chorando?

- Ahh sim, são lembranças muito fortes e boas... sempre me emociono.

- O senhor sente falta de Jesus, vovô?

- Sempre que me sinto só, eu falo com Ele. Falo com Ele todos os dias. E sei que em breve eu O verei novamente. É tudo o que eu mais quero.

- Eu também vovô!

- Eu também!

- Bom, vamos começar a aula de hoje. Vamos falar sobre o amor...

Hudson Almeida, imaginando como seria aprender da boca do apóstolo do amor sobre a vida do Senhor da Vida.

11 de janeiro de 2012

O pregador, o Mendigo e Jesus

Por Hudson Almeida,
numa noite em meu pensamento



Tá o pastor, no ponto de ônibus, aguardando o coletivo para seguir em frente após mais um culto na campanha “7 dias para prosperar”. O religioso sempre pegava o último ônibus rumo à sua modesta casa devido ao fato de ser o último a sair do templo. Propositalmente o fazia. Tinha vergonha de ser visto pelos membros entrando num ônibus.

Sozinho, aguardava a chegada daquele que o levaria até o seu lar (terreno). E ali, num protelar tedioso, vê um mendigo noviço – pois não o vira naquele ponto antes – aproximando-se com sua latinha de moedas atestando ter intenção de conversar.

Mendigo – Olá Pastor.

Pastor – Oi

Mendigo – O senhor é pastor da “Igreja Evangélica Conservadora Neo-Reformulada no Contexto Global”?

Pastor – Não. Sou da “Igreja Evangélica Conservadora Neo-Reformulada do Reino Dispendioso em Vida”.

Mendigo – É que os nomes são parecidos!

Pastor – Mas nós somos diferentes em vários aspectos teológicos de suma importância ao contexto cristão.

Mendigo – Eu sei. Hoje em dia as divergências relativizadas são motivos para o surgimento de novas congregações.

Pastor – Hã?

Mendigo – O que?

Pastor – Você já foi crente?

Mendigo – Eu sou.

Pastor – Mas assim, mendigando?

Mendigo – Eu posso ser Jesus, disfarçado de mendigo, testando sua caridade.

Pastor – Meu filho, eu não tenho nada pra te ofertar. Infelizmente meu dinheiro está no banco e só tenho o Rio-Card aqui.

Mendigo – Mas eu não entendo Pastor.

Pastor – O que?
Mendigo – Hoje no culto, o senhor falava da campanha “7 dias para prosperar” e desafiava os ouvintes a crerem que iram ficar prósperos em todas as áreas de sua vida.

Pastor – Sim, e?

Mendigo – Bem, é que o senhor não me parece do tipo próspero. O senhor utiliza ônibus, tem rio-card, não tem uma pratinha pra abençoar o pobre mendigo...

Pastor – Pois saiba que você também não me parece ser mendigo.

Mendigo – Por quê?

Pastor – Bem, seu português é bem mais correto que o da média brasileira, sua argumentação é peculiar a oradores experientes e seu conhecimento de causa é bem mais amplo que o de um mero observador de rua.

Mendigo – Mas eu sou mendigo sim. Não tenho onde morar, o que vestir ou o que comer. Vivo das esmolas que ganho durante o dia.

Pastor – Mas eu também sou próspero sim! Tenho uma linda família, um bom emprego, paz no coração e uma mente guiada pelo espírito.

Mendigo – Ah, mas eu estou falando da outra prosperidade, reverendo.

Pastor – Só conheço uma.

Mendigo – Não foi isso o que o senhor disse no sermão hoje.

Pastor – Anda assistindo os meus sermões?

Mendigo – Sentado na calçada o reverb me alcança.

Pastor – Olha você só pode estar me testando mesmo.

Mendigo – Eu lhe disse.

Pastor – Toma aqui um trocado, e tenha uma boa noite.

O mendigo pega sua esmola, dá alguns passos e pára virando-se para o pastor.

Mendigo – Pastor, não se preocupe, eu não sou Jesus.

Pastor – Por via das dúvidas, não é bom arriscar. Não me surpreenderia se fosse.

Mendigo – Pois eu sim. Sempre ouço dizer que vocês são os representantes de Jesus aqui na Terra. Mas hoje eu comprovei que isto não é bem assim.

Pastor – Está insinuando que eu não tenho Jesus?

Mendigo – Não é isso. Só acho quem parece com Jesus deveria pregar o que vive e viver a realidade do que prega.

Pastor – O seu problema é por eu não ter um carro do ano, uma mansão ou muito dinheiro no bolso né?

Mendigo – Não, não. É que há nove dias eu venho assistindo a campanha de 7 dias para prosperar e nada mudou em minha vida.

Pastor – Mas meu filho eu...

Mendigo – E nem na sua pastor. Boa noite.

Sai o mendigo. Chega o ônibus e o pastor, perplexo, sobe no coletivo e senta no banco da frente, pensando em sua vida, suas mensagens e se o mendigo realmente era ou não o próprio Jesus.